1968: O ano que não terminou “– (Editora Nova
Fronteira, 1988, 159 páginas), escrito pelo jornalista Zuenir Ventura.
Resultado de uma pesquisa de 10 meses em jornais e revistas, Zuenir fez a
reconstituição de um dos anos mais contraditórios e fascinantes de toda a
historia. Marcado pelo radicalismo e pela polarização ideológica, 1968 foi
palco de revoluções culturais, políticas e sociais em todo o mundo. No Brasil
vivia-se a ditadura militar, os estudantes iam às ruas como forma de
resistência, protestar e travar combates com a policia. Testemunha e
participante desses tempos, Zenuir vai além dos registros jornalísticos em seu
romance sem ficção. Apesar do rigor histórico em que os acontecimentos são
reconstituídos, ele conta de forma íntima e conceitual uma aventura de toda uma
geração.
A história começa num réveillon promovido pelo
casal Luís e Heloísa Buarque de Hollanda, à moda de uma revolução
comportamental. “O som combinava carnaval com Iê Iê Iê e os trajes se
apresentavam variados – smokings, longos, míni saia e roupas hippies de luxo”,
escreve o jornalista. Uma premonição do estado de espírito que seria predominante
no período. Nem sempre a atitude libertária naquele período era uma prática
liberal. A viagem experimental dessa geração resultaria numa série de
contradições.
Numa geração onde cada vez mais a juventude era
marginalizada pela ditadura, os jovens se tornavam presas fáceis para o
pensamento esquerdista. Os pensadores comunistas tinham preferência dentre o
público universitário. Nessa época, os best sellers eram Marx, Mao, Guevara e,
principalmente, Marcuse, que defendia que as minorias do sistema tinham vocação
natural para serem revolucionárias. Antigamente lia-se como hoje em dia se vê
televisão. Era o cenário ideal para discussões. A moda era politizar e militar.
“O cheiro de gás lacrimogêneo, o coro de ‘’abaixo a ditadura’’ pareciam
incorporados à paisagem urbana daqueles tempos”, aponta Zuenir.
Dentro de tantos acontecimentos marcantes do ano,
talvez a lendária Passeata dos 100 mil fosse o principal marco simbólico da
força estudantil. Resultado de uma série de fatos trágicos que chocaram e
indignaram não só o movimento estudantil, mas também a população, a passeata
contou com o apoio de vários outros segmentos da sociedade como mães, padres e
professores. O primeiro vetor que levou à passeata foi o confronto com a
polícia no restaurante Calabouço, que resultaria na morte do jovem Edson Luís.
Seria o primeiro incidente que sensibilizou a opinião pública para a luta
estudantil. Depois, a repressão da polícia na porta da igreja Candelária
indignaria a todos, porém, a sexta-feira sangrenta que levaria a população a
tomar partido e entrar na guerra.
Naquele ano a ditadura endurecia. O presidente
Costa e Silva assinava o AI-5 em Dezembro numa sexta feira 13. Os jornais
registravam como “rumores alarmantes” a possibilidade do ato que anularia os
direitos civis dos cidadãos e concentrava todo o poder ao Executivo. Com a
proibição da Frente Ampla, movimento político liderado por Juscelino
Kubitschek, João Goulart e Carlos Lacerda, tornara-se difícil lutar pela
liberdade através do dialogo. Dentre os vários motivos que o presidente foi
levado a assinar a medida estavam a rebeldia estudantil e a insubordinação do
Congresso Nacional.
“1968: O ano que não terminou” realmente faz jus ao
seu titulo de best seller. Zuenir Ventura consegue contar a historia de forma muito
íntima e fiel aos fatos históricos. Ao mesmo tempo, passa certa dramaticidade
que nos instiga à história. A maneira de contar separadamente os acontecimentos
em capítulos distintos amplia a percepção sobre os fatos. O humor e a ironia
que Zuenir usa ao comentar um depoimento ou uma situação, aproxima o leitor da
história. A apresentação das personagens também merece destaque. Ao citar
depoimentos de entrevistas da época, vinte anos atrás o autor faz um paralelo
de antes e depois de 68 de alguns personagens, como no caso de Vladimir
Palmeira, líder radical da UME na época de 68 e, vinte anos mais tarde, um
deputado vitalício que luta em favor do povo.
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