Está difícil eleger a
pior má notícia que Michel Temer recebeu nesse fim de semana. Quando eu me
preparava para escrever a respeito da bomba que caiu em seu colo com as novas
revelações dos grampos de Sérgio Machado que o "Fantástico" divulgou
ontem, me deparei com a informação de que ele colocou dois imóveis no valor de
2 milhões de reais em nome de seu filho Michelzinho, de sete anos, que, embora
seja aparentemente legal, pode ser entendida como uma evidente manobra para
esconder patrimônio, pois ele declarou à Receita patrimônio de apenas 800 mil
reais.
Por uma dessas ironias
do destino, tanto a bomba do "Fantástico" quanto a do Riocentro foram
detonadas por dois senhores de sobrenome Machado.
A do capitão Wilson
Dias Machado, destinada a provocar um atentado no show de Primeiro de Maio e
que explodiu, sem querer no dia 30 de abril de 1981 em seu colo, tinha por
finalidade abalar o governo do general Figueiredo; a de ontem, detonada por
Sergio Machado com a finalidade de incriminar seus amigos é mais um petardo que
abala o governo provisório, ao comprometer, numa tacada só, mais um ministro do
governo provisório; o presidente do Senado e vice de Temer e o próprio Temer,
que chegou onde chegou com a decisiva colaboração de Renan e que nomeou o
ministro que caiu em desgraça e, tudo indica, deverá cair ainda hoje. O destino
de Renan não será diferente já que, além de ser flagrado em manobras para
obstruir a Lava Jato, ficamos sabendo que está envolvido com o doleiro Alberto
Yousseff.
O ilustre desconhecido
Fabiano Silveira que no dia do grampo integrava o Conselho Nacional de Justiça
e hoje é o ministro da Transparência (parece piada) surge nos grampos não só
orientando Renan a se defender, mas no papel de seu emissário para espionar a
Lava Jato.
Renan se entrega ao
dizer que está preocupado com a doação de 400 mil reais que recebeu da
Transpetro e, para piorar ainda mais o quadro, o ex-presidente e seu
apadrinhado, Sergio Machado, suposto autor do grampo, que fez a tal doação para
a sua campanha, tranquiliza-o informando que os recibos foram providenciados
pelo doleiro Alberto Youssef. "Youssef [Alberto] cuidou disso", diz
Machado no grampo. O doleiro teria providenciado recibos, mas no valor total
maior, de R$ 800 mil.
Como é público e
notório que Youssef só entra em ação quando é necessário fazer um trabalho
sujo, ninguém pode ficar tranquilo com esse tipo de tranquilizante. É a prova
definitiva de que a doação era fraudulenta.
Não há como supor que
Renan continue na presidência da Senado, tão explosivo é o teor das gravações.
Ele terá que renunciar, pela segunda vez em sua carreira, "para se
defender", como se costuma justificar a retirada estratégica nos casos de
envolvimento em casos como o seu.
Mas não é só. É
previsível que seja aberto contra ele (ou a seu desfavor, como está na moda
dizer) um processo de cassação no Conselho de Ética por quebra de decoro e que
o STF o libere para ser interrogado em Curitiba.
Em outras palavras,
Renan, que até ontem era considerado por muitos o bam-bam-bam da política
brasileira, é mais uma carta fora do baralho de Temer.
É evidente que o
ministro da Transparência também vai cair. Embora seu papel fosse importante
para a turma, ele mesmo, por ser inexpressivo, não será um desfalque tão grande
assim, mas, ao ser desmascarado ele expôs o presidente provisório, pois ficou
claro que ele foi nomeado não para investigar o que acontece de errado no
governo e sim para ajudar Temer e seus amigos na árdua missão de driblar a
Procuradoria Geral da República e a Lava Jato.
Foi um fim de semana
de pesadelo para Temer. No sábado à noite ele se encontrou com o ministro
Gilmar Mendes, atual presidente do TSE, o que não pegou bem, não só porque
encontros fora de expediente são sempre suspeitos, mas porque o TSE analisa
atualmente o processo de cassação da chapa Dilma-Temer. Encontro esquisito,
esse.
Antes mesmo da bomba
do Fantástico, já havia indicações seguras de que a Globo não morre de amores
por Temer. O primeiro sinal surgiu no dia da reunião em que ele deu um tapa na
mesa, logo depois de anunciar, bem ao seu estilo, que uma das coisas que
"talvez" venha a fazer será tomar 100 milhões emprestados do BNDES.
Nessa mesma noite, enquanto as imagens da reunião eram exibidas na Globo News,
Merval Pereira foi taxativo ao declarar que ele não poderia fazer aquilo, a
constituição não permite.
O segundo sinal surgiu
ontem à noite, no programa Painel, no momento em que a âncora Renata Lo Prete
afirmou que erram os que tentam comparar o governo Temer ao de Itamar; mais
apropriado seria compará-lo ao de Sarney.
Levando-se em conta
que o governo Itamar foi bem sucedido e o de Sarney um estrondoso fracasso e
que as opiniões de Merval e de Lo Prete, longe de serem pessoais, expressam o
pensamento do diretor de Jornalismo da Globo e, em última análise, da família
Marinho, conclui-se que a maior emissora do país não está disposta a ajudar
Temer na mesma medida em que atrapalhou Dilma, quando convocou a população a ir
às ruas, que foi o álibi de deputados e senadores para aprovarem a primeira
fase do impeachment.
Tenho impressão que a
postura da Globo é a resposta à nomeação de Marcos Pereira para o ministério da
Indústria, Comércio e Desenvolvimento. Ele não é apenas um estranho no ninho,
sem nenhuma qualificação para esse cargo, mas um empregado de Edyr Macedo,
fundador do partido que preside e dono da Rede Record, com a qual a Rede Globo
mantém uma batalha de vida ou morte no ibope. Talvez tenha sido o mais fatal
dos muitos erros de Temer ao formar seu governo improvisado, pois governar sem
a Globo a seu favor é possível, mas com a Globo contra é arriscadíssimo.
Isso não quer dizer,
necessariamente, que a Globo tenha saudades da presidente Dilma, mas significa
que não vai ajudar Temer no segundo tempo do impeachment, o que já é um trunfo
para ela, cuja popularidade só cresce desde que foi deposta, passando de 18% a
33% de aprovação, mais um bom motivo para a Globo manter-se neutra: enquanto o
ibope da ex-presidente cresce, o do presidente provisório desce.
Aqui entre nós, nenhum
aliado do governo afastado poderia ter provocado tantos estragos ao seu
sucessor ilegítimo quanto os grampos de Sergio Machado e uma Rede Globo
mordida. Com que cara os senadores vão alegar, no segundo tempo da votação, sem
corar, que o impeachment se fundamenta nas pedaladas fiscais e no Plano Safra
diante de tantas evidências de que se tratou de uma conspiração contra a Lava
Jato?
A pior notícia para
Temer é a próxima.
Alex Solnik é
jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé,
Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os
quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar",
"A guerra do apagão", "O domador de sonhos" e
"Dragonfly" (lançamento setembro 2016).
Brasil 247
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