A madrugada de 11 para 12 de maio de 2016 virou com a impressão de
ter sido mais enevoada do que as outras deste outono. Ao determinar o
afastamento da presidenta da República legitimamente eleita Dilma
Rousseff por meio do golpe de um processo apodrecido de impeachment, o
Senado Federal aprofunda a ferida aberta na democracia nacional já no
fim das eleições presidenciais de 2014, quando perdedores decidiram, à
força, sair vencedores da disputa das urnas. É o movimento para remover,
sob quaisquer condições, um projeto popular e progressista de
desenvolvimento que passou a priorizar as camadas historicamente
excluídas das políticas públicas nacionais.
As sombras que começaram a se forjar no início de 2015, com as
primeiras manifestações que trouxeram o discurso da defesa da ditadura
militar, transformaram-se em uma jornada sem precedentes da intolerância
e do autoritarismo desde o fim do regime, em 1985. Cresceram com a
progressão de um pedido absurdo de impedimento presidencial sem os
devidos crimes de responsabilidade que a lei exige. Atingem dimensão
preocupante neste momento em que o golpe conseguiu a retirada da
presidenta por até 180 dias e permite ao vice-presidente Michel Temer
assumir sorrateiramente a cadeira presidencial como um vulto
esgueirando-se para onde não foi convidado.
Enganam-se, no entanto, aqueles que imaginam que os
movimentos populares e democráticos da sociedade brasileira assistirão
com passividade ao teatro detestável de conspiradores e saqueadores da
ordem democrática. A União Nacional dos Estudantes, representante dos
milhões de universitários e universitárias do país e uma das mais
antigas instituições da vida pública nacional anuncia que não
reconhecerá o governo de Michel Temer. Em cumprimento estrito da
Constituição Federal de 1988, conquistada após a morte de tantos que
lutaram contra o regime de exceção que a precedeu, a UNE tem o dever de
reportar-se como presidenta da República somente àquela que é de fato a
presidenta da República: Dilma Vana Rousseff.
Ainda que o golpe busque repetir a história de 1964, retirando os
tanques e metralhadoras de seu roteiro e incluindo togas e gravatas, não
conseguirá acuar a voz das ruas. Nos últimos meses, cresceu no país a
articulação inédita de movimentos organizados de trabalhadores,
juventude, camponeses, lutadores por moradia, mulheres, negros, LGBT,
coletivos de cultura e comunicação de todas as partes que formam a
Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo. A coalizão democrática
dessas forças engendrou a semente de um núcleo poderosíssimo de
resistência ao golpe, com força imensamente superior à dos movimentos
que tentaram resistir à ditadura iniciada em 1964.
Não haverá, portanto, um minuto sequer de trégua concedido aos
inimigos do povo. Estaremos nas ruas, nas universidades, nas redes
sociais, em todos os espaços alcançáveis em que possamos deixar a
denúncia da grave lesão sofrida pelo país. Foi com esse espírito que
crescemos e nos multiplicamos nos últimos anos, com manifestações que
ultrapassaram a marca dos milhões de brasileiros, com atos públicos de
norte a sul, acampamentos de resistência, ocupações, comitês
universitários, atividades culturais, ações estratégicas de comunicação e
a gestação espontânea de milhares de núcleos de defesa da democracia, a
maior parte formada pela juventude.
Não pensem os golpistas que o Palácio do Planalto os
pertence. A UNE, que teve muitos de seus militantes torturados e mortos
na luta democrática desta nação, não concede a Michel Temer, Eduardo
Cunha, Aécio Neves e outros trapaceiros o direito de rasgar a carta
magna das leis nacionais sobre seus corpos. Não passarão. Podem tentar
fingir, para o conjunto da sociedade, que estão do lado certo, mas terão
que disputar essa versão com a nossa militância na praça pública. Não
tememos, tampouco, que neste processo tentem nos prender ou nos matar,
pois, como o diz o ditado, se o fizerem, voltaremos em milhões. Somos
hoje jovens de todas as origens, estudantes filhos das famílias ricas ou
da periferia que chegaram à universidade por meio do avanço dos
programas sociais, do Prouni e do Fies, da reserva de vagas, da expansão
do ensino superior. Representamos a transformação de um país que não
aceitará retrocessos.
A noite de 11 para 12 de maio não será como a de primeiro de abril de
1964. Não deixaremos o Brasil submergir frente a sua própria soberania.
Não estaremos imóveis, não nos calaremos, reuniremos a força, a
motivação, a sensibilidade, a determinação e a criatividade que foram
capazes de nos fazer vencer em momentos bem mais dramáticos do que este
na história brasileira. Preparem-se golpistas. Aqui está presente o
movimento estudantil. O Brasil não anoitecerá mais uma vez.
União Nacional dos Estudantes
12 de maio de 2016
Fonte: UNE
O golpe de estado parlamentar aplicado sobre o mandato da presidente Dilma, legitimamente eleita pelo povo, é uma afronta vergonhosa contra os direitos democráticos do povo brasileiro. Ilza Kozik, Paraná
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